Ensino chinês chega ao Brasil com mandarim, inglês e até 10 horas de aulas
Rio foi a cidade escolhida para
receber a primeira Escola Internacional Chinesa, criada com financiamento de
empresários e apoio do governo chinês. Com investimento de R$ 3 milhões em
tecnologia, colégio tem 60% dos alunos brasileiros
Roberta Jansen, O Estado de
S.Paulo
Um dos maiores produtores
mundiais de vacinas, principal parceiro comercial do Brasil e líder em Ciências
e Educação, a China chegou à rede educacional brasileira. Foi aberta no Rio a
primeira Escola Chinesa Internacional, criada com o financiamento de
empresários chineses que vivem no País e com apoio do governo chinês. O
objetivo, segundo o site da escola recém-inaugurada, é proporcionar ensino de
referência internacional. O modelo será o da educação básica chinesa, em
ambiente trilíngue: mandarim, português e inglês.
A escola já investiu R$ 3
milhões em tecnologia. Tem tablets e quadros-negros digitais e um robô que
conversa em mandarim com os alunos, corrigindo sua pronúncia. O plano é abrir,
ainda este ano, uma filial em São Paulo – onde a comunidade chinesa é muito
maior.
Os chineses sentiam falta de uma
escola que garantisse a educação integral de seus filhos no País, com ensino de
mandarim e acesso a universidades chinesas. A China é o maior parceiro
comercial do Brasil há mais de dez anos. Cerca de 300 mil chineses vivem no
País.
Dezenas de empresas chinesas têm
filiais no Brasil, sobretudo no Rio e em São Paulo. Além do mandarim, a escola
mantém o currículo chinês, que é muito mais avançado em Matemática do que o
brasileiro, por exemplo. Também preza os ensinamentos do filósofo Confúcio (551
A.C./479 A.C.), entre outros aspectos da cultura e tradição chinesas. Os alunos
aprendem ópera e até culinária da China. A ginástica laboral – uma tradição nas
escolas e empresas chinesas – também está presente.
“Muitos de nós, chineses, viemos
para o Brasil já adultos; crescemos e estudamos na China”, afirma o empresário
Zheng Xiamao, um dos investidores da escola. “Mas nossos filhos nasceram aqui,
e percebemos que eles perderam um pouco da identidade, das raízes chinesas. Às
vezes não tínhamos nem tempo de ensinar o mandarim.”
Chineses que vivem no Brasil
contam que precisaram mandar os filhos de volta à China, ainda pequenos, para
garantir que aprendessem a língua e tivessem garantido o acesso às
universidades chinesas. Com o currículo brasileiro, é praticamente impossível
ingressar no ensino superior no país asiático.
“No Brasil e em outros lugares
do mundo existem escolas alemãs, britânicas, americanas. Por que não chinesa?”,
questionou Xiamao. “Elaboramos então esse projeto de termos uma escola 100%
chinesa.”
Mas a cultura brasileira também
está presente. Os alunos têm aula de jongo, por exemplo, onde aprendem a dança
brasileira de origem africana, típica de comunidades negras. Em uma aula
acompanhada pelo Estadão, crianças chinesas tentavam aprender a dançar e a
tocar os tambores típicos do ritmo ao lado de brasileirinhos levemente mais
cadenciados. As aulas de História e Geografia, claro, também seguem o currículo
nacional – uma exigência do Ministério da Educação.
A China, atualmente, lidera o
ranking mundial de educação, o Pisa, nas três categorias: Leitura, Ciência e
Matemática. Está à frente de todos os países escandinavos, tradicionalmente
muito bem colocados. O aluno formado nessa escola terá acesso não só a universidades
da China como também a instituições dos Estados Unidos e da Europa.
Dos cerca de 50 alunos já
matriculados, 60% são brasileiros, 30% são chineses e 10%, de outras
nacionalidades – há alunos americanos e italianos, por exemplo. “A maioria dos
nossos alunos é brasileira”, atesta a diretora da escola, Yuan Aiping, que vive
há 23 anos no Brasil. “E fico muito feliz de ver como os brasileiros abraçaram
a ideia e reconheceram a nossa educação como de alto nível. A troca cultural
certamente será imensa. Queremos um aluno globalizado.”
Entre os brasileiros que já
matricularam seus filhos na escola estão os deputados federais Clarissa
Garotinho e Pedro Paulo Carvalho, que atualmente é secretário de Fazenda e
Planejamento da prefeitura do Rio.
“A comunidade chinesa trazia as
famílias, mas, depois de alguns poucos anos, tinham de mandar os filhos de
volta se quisessem que eles cursassem uma universidade chinesa; são sistemas
educacionais muito diferentes”, conta o cônsul da China no Rio de Janeiro, Li Yang.
“Mas se estendermos a educação chinesa a outros países, essas crianças podem
ter a mesma educação que teriam na China e quando voltarem não terão
problemas.”
A primeira dificuldade, claro, é
a língua. Mas, mesmo sendo um sistema trilíngue (e o mandarim é escrito em
ideogramas), a experiência da escola mostra que as crianças absorvem
conhecimento muito rápido.
Entre os menores, na pré-escola,
não há propriamente aula de idioma. Mas eles são assistidos por três
professoras nativas: uma chinesa, uma brasileira e uma americana. Cada uma
delas só se dirige às crianças em sua língua natal. Funciona: as crianças
passam de uma língua para outra com grande naturalidade. “Os pequenos se
adaptaram muito rápido, muito mais rápido do que imaginávamos”, conta a
coordenadora pedagógica Josilene Germania.
A Matemática também é um grande
obstáculo. Segundo Yang, a Matemática ensinada no 2.º ano de educação básica na
China equivale ao que é ensinado no 5.º ou no 6.º ano em outros países. “Mas a
nossa escola é aberta também para as crianças locais, não apenas às chinesas”,
lembra o cônsul. “Assim, elas poderão ter acesso a uma educação de alta
qualidade, trilíngue, além de conhecer a cultura chinesa.”
Os alunos passam de oito a dez
horas na escola, o que pode parecer um pouco excessivo para alguns brasileiros.
A mensalidade também varia de R$ 4 mil a R$ 8 mil dependendo da idade da
criança e do número de horas que ela fica no colégio.
Vicente, filho da deputada
federal Clarissa Garotinho (PROS-RJ), completou 6 anos na semana passada. Na
hora do bolo, ele não se contentou em cantar parabéns apenas em português. “Ele
fez questão de cantar também em mandarim”, conta a mãe, orgulhosa.
O neto dos ex-governadores do
Rio Anthony e Rosinha Garotinho é aluno da Escola Chinesa Internacional desde o
início do período letivo deste ano. É um dos brasileiros mais avançados em
mandarim. Ele já se apresenta na língua asiática, dizendo seu nome e idade com
a entonação correta, para deleite dos professores chineses.
“Queríamos um colégio
internacional, para formar um cidadão global”, conta Clarissa. “Aí vimos que a
China é o primeiro lugar do mundo no ranking de educação e toda a parte de
tecnologia e matemática também é muito forte. No caso do Brasil, as relações
comerciais são cada vez mais próximas; enfim, achamos que seria um ganho
cultural muito grande.”
As mesmas razões nortearam a
decisão do atual secretário de Fazenda e Planejamento do Rio, Pedro Paulo, na
hora de matricular os dois filhos, Matteo, de 8 anos, e Lucca, de 6, na escola
chinesa. “O colégio tem tudo o que a gente estava buscando”, diz o secretário.
“Ninguém tem dúvidas de que o ensino chinês é o melhor do mundo. Tem a questão
da tecnologia, do contato com outras culturas, do ensino do inglês e do
mandarim, que é a segunda língua mais falada do mundo e rapidamente será a
primeira.”
Sem falar na matemática. Matteo
já é considerado uma promessa na matéria e é ensinado pessoalmente por um
professor chinês. “Sempre percebi essa aptidão dos meninos pelo cálculo”, conta
Paulo. “Por fim, a escola tem convênio com nove universidades chinesas, fora as
americanas, formação que dará a eles grande vantagem.”
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